sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Genealogia da Moral - Nietzsche

Genealogia da Moral é um livro de 1887, do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, o qual já comentei aqui inúmeras vezes, que aprofunda temas refletidos em seu livro anterior Além do bem e do mal. Sempre que estou lendo um novo livro dele eu venho comentar porque eles são muito parecidos e diferentes entre si, explico: são parecidos porque as angústias e críticas de Nietzsche tendem a ser comuns em quase todos seus livros - os temas filosóficos científicos, religiosos e metafísicos se repetem; e são diferentes porque a forma de trabalhá-los pode mudar ou mesmo contradizer uma opinião anterior. É isso que faz a filosofia de Nietzsche tão rica, você lê, pensa, debate, pode entender algo que ele disse de forma distinta da que ele pensou - isso provavelmente acontece muito -, mas você ainda sairá diferente. E leituras transformadoras são sempre bem-vindas, não? Não vou entrar em detalhes do que mudou nesse livro, mesmo porque ele é um complemento do anterior, Além do bem e do mal, e destrinchar um livro desses faz com que ele perca parte do seu dever de fazer ruminar. Deixo somente, portanto, um exercício: "Esta é a longa história da origem da responsabilidade. A tarefa de criar um animal capaz de fazer promessas, já percebemos, traz consigo, como condição e preparação, a tarefa mais imediata de tornar o homem até certo ponto necessário, uniforme, igual entre iguais, constante, e portanto confiável. O imenso trabalho daquilo que denominei 'moralidade do costume' - autêntico trabalho do homem em si próprio, durante o período mais longo de sua existência, todo esse trabalho pré-histórico encontra nisto seu sentido, sua justificação, não obstante o que nele também haja de tirania, dureza, estupidez e idiotismo: com ajuda da moralidade do costume e da camisa de força social, o homem foi realmente tornado confiável. Mas coloquemo-nos no fim do imenso processo, ali onde a árvore do costume finalmente trazem à luz aquilo para o qual eram apenas o meio: encontramos então, como o fruto mais maduro da sua árvore, o indivíduo soberano, igual apenas a si mesmo, novamente liberado da moralidade do costume, indivíduo autônomo supramoral (pois 'autônomo' e 'moral' se excluem), em suma, o homem da vontade própria, duradoura e independente, o que pode fazer promessas - e nele encontramos, vibrante em cada músculo, uma orgulhosa consciência do que foi finalmente alcançado e está nele encarnado, uma verdadeira consciência de poder e liberdade, um sentimento de realização. Este liberto ao qual é permitido prometer, este senhor do livre-arbítrio, este soberano - como não saberia ele da superioridade que assim possui sobre todos os que não podem prometer e responder por si, quanta confiança, quanto temor, quanta reverência desperta - ele 'merece' as três coisas - e como, com esse domínio sobre si, lhe é dado também o domínio sobre as circunstâncias, sobre a natureza e todas as criaturas menos seguras e mais pobres de vontade? O homem 'livre', o possuidor de uma duradoura e inquebrantável vontade, tem nesta posse a sua medida de valor: olhando para os outros a partir de si, ele honra ou despreza; e tão necessariamente quanto honra os seus iguais, os fortes e confiáveis (os que podem prometer) - ou seja, todo aquele que promete como um soberano, de modo raro, com peso e lentidão, e que é avaro com sua confiança, que distingue quando confia, que dá sua palavra como algo seguro, porque sabe que é forte o bastante para mantê-la contra o que for adverso, mesmo 'contra o destino' -: do mesmo modo ele reservará seu pontapé para os débeis doidivanas que prometem quando não podiam fazê-lo, e o seu chicote para o mentiroso que quebra a palavra dessa rara liberdade, desse poder sobre si mesmo e o destino, desceu nele até sua mais íntima profundeza e tornou-se instinto, instinto dominante - como chamará ele a esse instinto dominante, supondo que necessite de uma palavra para ele? Mas não há dúvida: este homem soberano o chama de sua consciência..."

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